domingo, 28 de fevereiro de 2010

Turma dos 'Sem Turma'




“Quando me comparava com os demais, sentia-me muitas vezes orgulhoso e satisfeito comigo mesmo, e em outras tantas deprimido e humilhado. Ora me acreditava um verdadeiro gênio, ora fraco do juízo. Não me era possível compartilhar a vida e as alegrias dos outros rapazes de minha idade, e às vezes reprovava asperamente o meu isolamento e sentia profunda tristeza, crendo-me definitivamente afastado de todos os meus semelhantes, com todas as portas da vida fechadas irrevogavelmente para mim.”
(Herman Hesse - "Demian")

Depois que entrei na faculdade (talvez um pouco antes, mas agora é mais explícito), comecei a perceber algumas coisas.. em mim.. e nos outros. Uma dessas coisas que percebi é que todo mundo tem uma turma, uma tribo, um grupo! E eu fiquei tentando descobrir em que grupo eu me encaixava. Em vão! E não é por antipatia não, longe disso. Mas não consigo me colocar em uma "turma".
Antes eu fosse uma solitára, ficaria na turma dos solitários! Mas nem isso. Sou sim sociável, conheço bastante gente, converso à beça... me entendo com todos os "clãs"... mas não encontro a minha turma!
Embora todo mundo seja diferente de todo mundo... sempre tem aqueles que se assemelham em tantas coisas que acabam se unindo. E eu não encontro ninguém! Ninguém que sequer se esforce (ou se interesse) em tentar entender quem eu sou, ninguém que se identifique com as minhas esquisitices e com o meu modo estranho de enxergar e levar as coisas... ninguém que aguente 15 minutos das musicas que eu gosto... que consiga assistir inteiro os filmes que eu vejo... que se divirta nos lugares que me fazem bem! E quando encontro alguém que até goste de tudo isso.. essas pessoas têm valores tão diferentes dos meus que acabam se afastando ou virando aqueles "amigos de ocasião" (que a gente chama prá festa, mas não consegue contar um segredo, sabe?). Tenho sim grandes amigos... poucos... três grandes amigas de verdade e uns dois ou três grandes amigos... outros tantos em quem até confio e posso chamar de amigo, mas que eu sei que na primeira mancada talvez me virem as costas. Mas por descuido do destino (e essa vida estabanada da gente)todos esses grandes e verdadeiros amigos ou moram longe, ou o tempo trata de afastar fisicamente!
O pior de tudo isso (ou o melhor, sei lá!)... é que não consigo sentir solidão! Não, não.. não sou uma pessoa solitária... tenho um namorado lindo, uma família divertida (mesmo com as centenas de defeitos!), colegas de faculdade que eu adoro, um irmão e uma irmã que apesar dos raros encontros são umas preciosidades, etc. Sou apenas uma pessoa que se sente incompleta socialmente! Como se tivesse sempre na época e no local errado... como se não fizesse parte desse mundo.. como se não se adaptasse ao meio em que vive... com uma inquietude que ora alegra e ora deprime! Um sentir-me sozinha mas acompanhada! Ou acompanhada, mas sozinha.. já não sei bem! Nietzsche escreveu: "Odeio quem me rouba a solidão sem verdadeiramente oferecer companhia"... e é bem assim que eu me sinto... como alguém de que a solidão foi roubada e a verdadeira companhia negada. Não me falta amigos, falta-me é companhia!!!
Não sou triste ou melancólica por essa companhia desacompanhada... sou bem alegre até... mas falta-me.. se me falta, algum dia vai doer.. em algum momento.. em algum lugar... vai-me doer.

Termino aqui com mais um trecho do Herman Hesse, do mesmo livro "Demian"... o Hesse tem uma solidão na sua literatura que se assemelha com a que eu sinto.. que é essa quando se está acompanhado de meio mundo, mas mesmo assim só!


"Não há porque te comparares com os demais, e se a natureza te criou para morcego, não deves aspirar a ser avestruz. Às vezes te consideras por demais esquisito e te reprovas por seguires caminhos diversos dos da maioria. Deixa-te disso. Contempla o fogo, as nuvens, e quando surgirem presságios e as vozes soarem em tua alma, abandona-te a elas sem perguntares se isso convém ou é do gosto do senhor teu pai ou do professor ou de algum bom deus qualquer. Com isso só conseguimos perder-nos, entrar na escala burguesa e fossilizar-nos.
Não devemos temer nem julgar ilícito nada do que nossa alma deseja em nós mesmos.
A única realidade é aquela que se contém dentro de nós, e se os homens vivem tão irrealmente é porque aceitam como realidade as imagens exteriores e sufocam em si a voz do mundo inteiro. Também se pode ser feliz assim; mas quando se chega a conhecer o outro, torna-se impossível seguir o caminho da maioria. O caminho da maioria é fácil, o nosso é penoso. Caminhemos.”



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3 comentários:

Mariana Penna disse...

Oiii Juuu, qto tempo.
Vc não sabe como fikei feliz em ler esse post. Me sinto exatamente assim. Só com uma diferença: parece q a unica turma que sempre me encaixo é dos meninos, rs. Nunca vi ter tanto amigo do sexo oposto como eu. E essa de me sentir exclusa vem desde o coléio mesmo e se estende até os dias de hj, rs!!

Mto show seu blog Ju.
Bjãoo!!!

CAROLINA BERNARDES disse...

Juliana
Engraçado. Passei pelo seu blog, porque agora também sou blogueira e vivo fuçando nas escritas dos outros... Lendo seus textos, comecei a me lembra de mim quando era jovem (pq já estou a caminho dos 40, ô tristeza). Você lê as mesmas coisas que eu lia (e ainda leio), cita autores que eu admiro, sente coisas parecidas com as que eu sentia... tudo muito parecido comigo. E o tempo passou. Virei mãe, tive que crescer, cuidar, ser responsável, mas a jovem continua a mesma. Dores, preocupações, incertezas, questionamentos existenciais... A sua grande vantagem é ter o blog como meio de se expressar. "Na minha época" (numa me imaginei dizendo isso, mas tenho dito tanto!) não existia internet; eu tinha que anotar meus pensamentos em milhares de papéis, que hoje estão perdidos. Também vivia entre a ideia de ser atriz e escritora. Também amei demais e me senti sem tribo. E o tempo passou. E hoje continuo sem saber quem sou. Desculpe a melancolia, mas seu texto me trouxe a emoção da junção dos tempos - meu ontem e meu hoje. Grande abraço pra você.
E passa lá no meu blog, você vai gostar.
Carol
http://retalhoseepopeias.blogspot.com

Lua disse...

Moça... Já li o livro e gostei da comparação que você fez com a sua vida e o sentimento de não pertencimento a tribos do personagens. Sabe, não aguentam muito minhas músicas, sou esquisita, assisto uma porçao de filmes que ninguem nunca viu e nem entende o que é e ninguem se dedica um pouco do tempo a me entender. Mas eu busco entender a todos.
Me identifico muito também com artes e gosto de poesia, de escrever. Meu blog é recintodoslunaticos.blogspot.com.

Estou te seguindo!

Enfim... Quem sabe tenhamos esquisitices parecidas. To afim de compartilhar e trocar ideias, to aberta a isso. Abraço