
Aos que não sabem (e também aos que sabem), eu trabalho com crianças desde quando eu ainda era criança! Antes com as peças de teatro, depois no Projeto Social Vagalumes e atualmente dando aulas e fazendo recreação. E eu já trabalhei com crianças de todas as idades, etnias, classes sociais e histórias de vida possíveis e imagináveis. E nesse caminho de dores e delícias eu aprendi muita coisa sobre crianças, sobre filhos, sobre pais e sobre trabalhar com crianças. É coisa difícil mas prazerosa. Elas são surpreendentes e conseguem renovar nossas energias ao mesmo tempo em que a suga por completo. O cansaço de trabalhar com crianças é um cansaço diferente... é um cansaço gostoso, que desgasta a gente mas dá prazer, satisfaz, alegra. Quando eu estou com elas eu aprendo muito mais do que aprendo quando estou cercada de adultos diplomados. Elas me ensinam a ser mais sensível com o mundo, a olhar mais prá fora, a simplificar as coisas. Já perdi as contas de quantas vezes cheguei exausta, desanimada, sonolenta e saí pulando, rindo, cantando. Eu sempre acho que me divirto com elas muito mais do que elas comigo.
Sim.. são umas pestes! Por deus... como conseguem ser tão doces e divertidas e ao mesmo tempo tão elétricas, malcriadas, difíceis de lidar! Eu demoro meia hora prá fazê-las entender que têm que formar uma fila e que não podem se jogar dos brinquedos senão vão se estabacar no chão. Tem umas que às vezes quero puxar a orelha e prender de ponta cabeça no ventilador... daí elas olham prá mim com uma cara de deboche/sapeca e caem na risada (porque eu devo mesmo ter cara de besta!rs)... e eu esqueço da bronca e me jogo com elas.
Enfim... mas tem algo que me cansa muito mais do que as crianças: os pais!
Eu sou da seguinte opinião: filho é escolha! Salve raríssimas excessões todos nós temos acesso a informação. Todo mundo sabe como se faz filho, todo mundo sabe como evitar filhos (e é coisa que temos gratuitamente no nosso precário sistema de saude), e em caso de acidentes, todo mundo sabe o que fazer no dia seguinte! Sendo assim, é escolha, e uma escolha muito séria! Escolher ter um filho não é como escolher comprar uma bolsa, nem um carro ou um apartamento. Esses ultimos a gente pode vender, trocar, abandonar caso encham demais a nossa paciência... criança não! Filho é prá sempre e ponto final... não é como brincar de boneca, nem como ter um sobrinho ou 120 alunos! Filho a gente não devolve no fim do dia. E isso a gente sabe mesmo sem sermos pais, certo!?
Tenho observado muito a relação pais-e-filhos nos trabalhos nas escolas, projetos sociais e recreações. E o que mais vejo são pais desesperados sem saberem o que fazer com as crianças; pais querendo arrumar qualquer maneira de terem os filhos distantes pelo máximo de tempo possível. Alguns alunos meus ficam o dia todo no colégio, em período integral. São crianças pequenas, na maioria, filhas de pais muito jovens.
O mais engraçado é ver como eles cobram de nós (professores e monitores) paciência, carinho e atenção com os filhos deles. E então oferecemos o melhor que podemos ser. Aguentamos as malcriações, pegamos no colo quando o choro estridente vem, olhamos nos olhos e tentamos entender os motivos, rimos com as brincadeiras, respondemos milhares de vezes a mesma pergunta, amarramos os cadarços embaraçados, cuidamos dos machucados, tocamos com cuidado prá não agredir, arrumamos os vestidos amarrotados pelo escorregador, prendemos o cabelo que desmanchou com a intensidade da baderna, falamos baixo prá poder ouví-los, nos permitimos conversas malucas sobre lápis de cores super heróis que salvam o mundo do dinossauro voador! E então o nosso tempo com eles acaba... devolvemo-os aos pais e... só o que vemos são puxões pelos braços para andarem rápido, berros e safanões, olhares esquivos muito mais preocupados com o horário da novela do que com a experiência que a criança acabou de vivenciar. Acho que estamos vivendo a geração de pais mais desesperados, inseguros e imaturos de todas. Ou não dão nada... o oferecem tudo em excesso. Criança também precisa ouvir não, precisa saber que a relação de pai e filho não é a mesma que de coleguinhas de escola. Eu vejo pasi fazendo mais birra do que os filhos, vejo filhos quase implorando por uma bronca... por um não... por uma palavra firme e um olhar certeiro. Criança tem nos pais a dimensão de segurança. Se os pais não têm segurança prá dizer um não aos filhos esses se vêm totalmente perdidos. E daí começam a série de traquinagens, palavrões, pirraças, comportamentos agressivos, olhares desafiadores. É a maneira que elas encontram prá chamarem a atenção dos pais, que só se movem quando o filho machuca ou faz alguma coisa muito grave. Então vêm as nomenclaturas tão equivocadas quanto o tipo de educação que os pais de hoje oferecem aos seus filhos. Se a criança é muito elétrica e agressiva ela é "hiperativa"... não é que ela não tenha a atenção devida, nem que ela não tenha espaço adequado para brincar e gastar energia, ou que ela passe o dia todo no computador ou na frente da tv, ou que assista as brigas e discussões frequentes dos pais, ou que não tenham com os pais a segurança de um "não" na hora que precisam.
Liberdade extrema, se mal colocada, prende muito mais do que um não bem usado.
Penso sempre na relação que tive com a minha mãe. Nunca levei um tapa e ouvi poucos "nãos"... mas sempre tive orientação na minha liberdade de escolha. Sempre ouvi as consequências que a minha escolha causaria... o que seria bom e o que seria ruim... e tive a opção de escolher se queria ou não aquele caminho. Sempre tive a paciência do "ouvir".. e olha que eu falo à beça... e fui uma criança daquelas que vão ao mercado vestidas de fada e se escondem nas araras de roupas para fugir do capitão gancho (que normalmente é a coitada da mãe que se divide entre as compras do mês e a procura pelo pentelho). Sempre pude contar com a presença dela nas minhas decisões, e nas suas consequências. Sempre ouve a cobrança pela boa nota, pelo respeito com os outros, pela tolerância com o diferente e pela postura nos lugares. Se aprendi bem eu não sei... mas tive e se segui por caminhos tortos foi por escolha e não por falta de orientação, segurança, carinho e atenção.
Observar os meus "filhos temporários", me faz pensar em que tipo de filho eu quero deixar para o mundo... e que tipo de mãe eu quero ser prá que isso não se torne desastroso. E eu descobri que quero ser uma mãe do tipo monitora de parque inflável!!!
Evoé!
2 comentários:
Parabéns!
Vc esta certíssima!
Adorei!
Gostei Muito, Me vejo em algumas das situações,Parabens, pena que algumas mães não enchergam isso, e jogam as bonbas nos professores, e Monitores.
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